Como Degustar uma Cachaça – Seu Nascimento

Por Fabiano Assunção

Antes de iniciarmos uma conversa sobre as etapas da degustação, é preciso nivelar alguns pontos sobre o processo de fabricação da cachaça e qual o papel de cada um destes no resultado sensorial final, tanto em qualidades, quanto em defeitos.

Fabricar uma bebida destilada a princípio parece fácil, mas cada etapa têm detalhes que geram diferenciais na constituição dos aromas, sabores e demais aspectos sensoriais herdados.

Sobre as etapas de fabricação da cachaça

Após a colheita da cana madura, esta tem de ser processada para extração do caldo em menos de 24 horas, pois sua deterioração natural pode gerar alterações no sabor ou queda no rendimento de açúcares pelo consumo das células vegetais, que manterão suas atividades gastando suas reservas de energia enquanto não forem moídas. Outro fator importante é a contaminação biológica que aumenta o risco a cada hora de espera e também podem arruinar uma boa fermentação.

Com o caldo extraído, este tem que ser diluído com água potável até que se tenha uma taxa de açúcares ideais para a proliferação e fermentação feitas pela Levedura (Saccharomyces sp.). Estes fungos são o pelotão do trabalho pesado, convertendo o açúcar sacarose em álcool etílico. Sua atividade biológica é tão intensa que os tanques de fermentação geram calor na faixa de 30 a 36º C e em locais quentes é necessário refrigera-los para manter o rendimento ideal.

Nesta etapa, o caldo + água + leveduras é chamado de mosto. Agora você sabe o que significa aqueles dizeres do rótulo “Ingredientes: mosto fermentado de caldo de cana de açúcar”, que é o resultado do fim da atividade de fermentação, onde não há mais sacarose, pois foi toda transformada em álcool.

O mosto fermentado é injetado no alambique e aquecido para que o álcool seja separado pela destilação. Nesta etapa é crucial equilíbrio, controle da temperatura para que o processo ocorra em um ritmo tranquilo para separar as 3 fases da destilação, que são:

A fase inicial, conhecida como cabeça, que contém compostos tóxicos como o metanol, álcoois superiores; a fase intermediária, conhecida como coração, que é a cachaça de qualidade, com predomínio de etanol e água; e a fase final, conhecida como cauda, na qual encontram-se compostos pesados, oleosos, tóxicos e de aroma e paladar depreciativos, também conhecida como “água fraca”, por ter menos de 39ºGL de teor alcoólico.

Cachaça boa e pura é só de coração! Todos os fabricantes registrados seguem esta norma e são fiscalizados por laudos químicos para atestarem sua qualidade e segurança a cada safra ou lote.

Grande parte dos produtores não registrados, ou oficiais, deixam de fazer esta separação, popularmente conhecida como “corte da cabeça e cauda”, recolhendo toda a destilação para engarrafar, processo conhecido como “bica corrida”, no entanto nisto implicam riscos de intoxicações e exposição à compostos cancerígenos, como o Carbamato de Etila. Ninguém sabe o que tem ali, já que não foram feitas análises, como foi fabricada e se atende a requisitos de higiene e potabilidade. Isto não significa que todo produtor artesanal, clandestino ou por hobby, tenha só cachaça ruim ou perigosa, mas não é recomendado, já que não é possível ter garantia de que o produtor é consciente e toma os cuidados necessários, para oferecer um produto confiável.

Com o recolhimento do coração da destilação, seu teor alcoólico está acima do de consumo, é concentrada, mas ideal para ser destinado ao amadurecimento e envelhecimento.

Toda cachaça recém destilada tem que descansar em tanques de inox ou tonéis de madeira de 3 a 9 meses para que amadureça e perca sua agressividade, amacie e realce sabores do frescor vegetal da cana e fique mais agradável ao paladar.

Quando colocada em recipientes de madeira, a cachaça captura e reage com vários compostos do lenho e o envelhecimento ocorrem após 3 anos, além deste prazo, eleva-se a categoria da cachaça para premium ou extra premium.

Recipientes de inox ou madeira branca produzirão a cachaça clara, a qual chamamos de “prata” e nas madeiras de cor, produzirão a cachaça “ouro”.

Antes de engarrafar, ocorre a última etapa que é a padronização – o lote separado tem seu teor alcóolico ajustado pela adição de água desmineralizada/deionizada e são feitas as correções pelo Master Blender / Padronizador para que a safra fique dentro dos padrões sensoriais de qualidade ligadas à marca/rótulo. Pronto, está na garrafa! É só consumir.

Agora que você conheceu este resumo das etapas do nascimento de uma cachaça, vamos, nos próximas artigos tratar de cada item da análise sensorial na degustação. O que procurar de qualidade e defeito em cada um, correlacionando com a etapa da fabricação, que foi mostrada aqui, para que você consiga imaginar e criar um raciocínio que permita saber e falar qual foi o caminho percorrido da cana ao copo, para que aquela característica detectada esteja ali presente.

Matéria Publicada em Cachaciê.

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