Paladar e cachaça: o toque final

Estamos terminando, com este artigo, esta breve jornada na degustação da nossa querida Cachaça com a melhor parte: beber!

O contato direto com a bebida se dá na boca, onde tem a oportunidade de “tatear” finalmente e julgar se todas as observações das etapas anteriores estão de acordo e correspondendo à expectativa deste contato final, que pode ser apenas a continuidade do esperado, uma surpresa ou uma decepção.

Uma cachaça bem trabalhada deve ter harmonia na parte olfativa e gustativa, uma complementa a outra.

Como a língua e mucosas entram agora em cena, é possível perceber detalhes como a picância, a reação de salivação desencadeada pelo contato, o adocicado, o azedo, o amargor, o salgado*, o retrogosto ao fim do gole e também uma complementação na percepção dos aromas pelos vapores que fazem o caminho interno inverso do palato ao nariz.

É muito importante nesta etapa que o mesmo cuidado anterior com a hidratação do seu corpo seja mantido e há uma dica, tome um ou dois goles mínimos da bebida para que você acostume com a sensação do contato das mucosas com a cachaça, deixando-a   passear por toda a boca, assim como se faz ao chupar uma bala.  Na hora que sentir que a sensação estabilizou, você tem mais sensibilidade para concentrar na degustação.

No gole seguinte, você passa a verificar a presença dos gostos primários (amargo, azedo, doce, salgado) e pode tentar estabelecer uma escala de intensidade para cada um.

Se o contato for muito agressivo, além do esperado pelo teor alcoólico, despertando intensa salivação, mesmo a análise olfativa tendo sido boa, há um possível problema, provavelmente no descanso desta cachaça, que pode ter sido curto demais para sua maturação, ou em certas madeiras novas, que podem desprender resinas, taninos que só são perceptíveis no paladar. Se isto passou batido, a padronização e checagem final de qualidade não foram boas, a não ser que isso tenham sido proposital.

Para aprofundar nos aromas, com a bebida na boca, incline bem a cabeça para frente e mexa a mandíbula fazendo com que sua boca encha de ar vindo do nariz, fechando lentamente a mandíbula para que este ar retorne ao nariz. Este movimento de bombeamento leva a sentir os aromas muito mais intensos e em certas vezes, a revelar outros, que ainda não tinham sido detectados.

Se for degustar outra bebida em seguida, é importante retificar seu aparato sensorial gustativo, bastando para isso beber água fria ou gelada e comer um biscoito água e sal ou uma fatia pão francês bem assado.

Para divertir, além de repetir a dica de artigos passados, em comparar as notas de degustação entre amigos, ouse em descobrir harmonizações com outros alimentos, pratos e petiscos com sua cachaça.

Agora que você trilhou todo o caminho para a degustação, beber uma cachaça jamais será a mesma coisa. Ensine também a todos que se interessarem, pois temos que valorizar nossa bebida nacional, única, diversa e o verdadeiro “espírito” que brinda a cultura e a gastronomia brasileira.

E lembre-se: evite o consumo excessivo de álcool, beba para ter prazer e não para tirá-lo. Se beber, não dirija!

Grande Abraço!

*Raríssimo ocorrer, no máximo lembrando uma água levemente salobra e mesmo assim em caso de defeito no processo de fabrico ou se a pessoa possui uma salivação exacerbada com histórico de cálculos salivares, conhecida também como Sialolitíase, onde há concentração de sais de cálcio que podem se precipitar nos ductos salivares e tendo correlações com mucoceles e rânulas. Esta situação predispõe ao portador em alguns casos a ter uma sensação de salivar “salgado” e pode se confundir como sendo do alimento.

**Fabiano A. Assunção, cachacier, master blender do Alambique Magos de Minas e membro da comissão de autofiscalização da AMPAQ

FONTE: Cachaciê

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